O tempo parou por algumas horas na noite de domingo (26), quando Gilberto Gil subiu ao palco da Farmasi Arena, no Rio de Janeiro, para mais um capítulo de sua turnê de despedida, Tempo Rei – A Última Turnê. Era o segundo show do fim de semana, e o público, que lotou a arena, parecia saber que estava prestes a viver algo que vai ficar guardado na memória por muito tempo.
O espetáculo, marcado para as 20h e iniciado por volta das 20h45 foi um reencontro. Gil, sereno e luminoso, conduziu a plateia por seis décadas de história, entre versos que moldaram a música brasileira e canções que atravessaram gerações. “Palco”, “Andar com Fé”, “Drão” e “Tempo Rei” soaram como mantras, acompanhados por coros emocionados vindos de cada canto da arena.
E se o repertório permaneceu fiel ao da turnê, as surpresas vieram com os convidados da noite: Paralamas do Sucesso, Flor Gil e Jorge Ben Jor. Juntos, transformaram o palco em um grande encontro de afetos e celebração. O abraço musical entre Gil e Jorge Ben Jor fez o público vibrar, uma reunião simbólica de duas forças que ajudaram a desenhar a alma da MPB. Já a presença de Flor Gil, neta do cantor, trouxe ao show um toque íntimo e familiar. Jorge Ben Jor se juntou para cantar clássicos como “Emoriô, “Filhos de Gandhi” e “Rei do Maracatu”. Já Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone, dos Paralamas do Sucesso, subiram ao palco para uma versão de “A Novidade”. A neta de Gil, Flor Gil, também participou, cantando “Estrela” com o avô.
Entre uma música e outra, Gil abriu espaço para as histórias, aquelas que revelam o quanto sua trajetória é feita de encontros e memórias. Ao lado da neta Flor Gil, ele relembrou com carinho o momento em que ela, aos 9 anos, pediu para cantar com o avô pela primeira vez, quando ainda morava nos Estados Unidos. A lembrança arrancou sorrisos da plateia e deu ainda mais leveza à apresentação.
Houve também um momento divertido quando Ben Gil lembrou de quando pediu ao pai que o ensinasse a tocar violão. Gil, com seu jeito sereno e bem-humorado, respondeu que talvez não fosse o melhor professor, afinal, nunca teve métodos nem técnicas formais, sempre tocou de forma intuitiva. A história arrancou risadas da plateia, especialmente quando o cantor, com a voz levemente cansada, brincou com o próprio fôlego em meio a um show para milhares de pessoas.
Já com Jorge Ben Jor, o tom foi de nostalgia: os dois contaram a história de um jornaleiro que ajudou Ben Jor a se esconder enquanto Gil era levado em um camburão durante os tempos de repressão. Uma memória dolorosa, mas contada com o humor e a cumplicidade de quem sobreviveu cantando.
Entre luzes, projeções e
aplausos, Gilberto Gil fez do palco um espelho da própria vida: cheia de fé,
ritmo e humanidade. Sua despedida das grandes turnês não soa como um adeus, mas
como um agradecimento. Porque o tempo é rei, mas Gil é eterno.

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